terça-feira, 3 de setembro de 2013

Ao filósofo boêmio canino



Sinto-me como um velho sábio
Ancião de memória
Mas sou tão novo de história
E de glórias, diga-se de passagem, 
Quanto aos mais novos de minha geração
Aos quais reconheço, mesmo que avesso
Em certa ocasião,
A reflexão de minha própria imagem

Pois sou um pão francês 
Em meio ao que estupidamente nomeio
De pães de mês

Mas, ora, que enganação
Pois quando nos passarmos à mão do freguês 
Sem coração
As diferenças em nossas essências
Serão apenas objetos de apreensão
Pra decidirem a quem comerão primeiro
E seremos mastigados, deglutidos
Digeridos e em ação descomidos
Pela nossa própria desunião

Sou um chão de bagagem
Mas, pesado em meu próprio peso
Um animal pobre e indefeso
Crendo manter em si preso
O novo de mutada linhagem

Êta, molecagem! Êta, afobamento!
De querer ser homem por ter tantas primaveras
Pré-designadas como amadurecimento 
Em quase todas as esferas
Num sistema de ensinada vassalagem

Não exatamente como antigamente era
Talvez mais inteligente seja esta
Subliminarmente mais severa
Mais convincente

Ah... Que pena do mundo!
Que pena de mim, da gente
Que pena que a humanidade
Contenta-se em ser demente
Por crer em diabos fecundos
Travestidos de celibatários cristãos 
Enquanto chama de moribundo
Quem tem carência de opção

Às ladradas do cão, meu uivo descamba 
Por querer barulho
E faço tal homenagem ao irmão de samba
De renovação e de bagulho
Pra que não nos calemos
Pois, pequenos, ah, não! Não somos
Somos inteiros Axé
Fé e inspiração
Paixão pela luta e pela reconstrução

Somos, meu querido barão da ralé
Um realismo místico 
Entre outros ismos artísticos

Somos galliardismo
E bem sabes o que isto é
Em ascensão.



(Arthur Valente)